Em 2022 o Instituto Semeia ouviu 1.541 pessoas em 10 regiões metropolitanas. Chapada Diamantina é o parque mais citado pela população. Não é à toa.

A pesquisa é repetida a cada dois anos. O wikiparques descreve alguns dos resultados, a pesquisa pode ser encontrada na íntegra no link abaixo.

Há quem diga que há mais de 1 mil km de trilhas dentro desse parque

Não temos como comprovar, mas não dá para duvidar. Nós caminhamos mais de 200km, e isso porque tivemos um contratempo (um braço quebrado), que fez com que reduzíssemos a quantidade e dificuldade dos atrativos a serem visitados.

Há quem diga também que este parque tem a área de Portugal, outros dizem que da Bélgica. Por mais gigante que seja, ele tem 1,7% a área de Portugal e 5% a área da Bélgica. Isso não diminui sua beleza, importância e encanto, é um dos parques nacionais mais conhecidos do Brasil. Mesmo quem nunca visitou, cita como um parque nacional.

Antes de contarmos as maravilhas deste parque, vale a pena contar um pouco da história. O nome não é por acaso, aqui o diamante foi extraído por quase 180 anos. Inicialmente o diamante que é vendido como jóia, extraído de forma manual com bateias. Aos poucos, quando foram encontradas minas de diamante na África, com maior valor e menor custo, outro diamante passou a ser extraído.

O diamante negro, ou carbonado, que é usado para perfurar rochas muito duras

Sua extração já foi feita com maior impacto ambiental, dinamitando grandes rochas, mudando cursos de rios.

Foi assim que quase a totalidade da flora desta região foi queimada e extraída, que muitas cachoeiras foram modificadas. O metrô de Londres e o Canal do Panamá foram construídos usando o carbonado retirado daqui. Posteriormente houve uma retirada de árvores com “madeira de lei” e então as sempre-vivas, ainda extraídas na região. Hoje o foco é no turismo.

Ou seja, apesar de ser tudo lindo, vale a pena lembrar que é tudo modificado. Faz parte da educação e interpretação ambientais, objetivos de parques nacionais, observar, entender e evitar incorrer em impactos tão grandes quanto esses.

E por onde começar, se este parque é confundido com um país?

Pois é, são várias cidades que ficam ao redor do parque, onde você encontrará hospedagem, restaurantes, supermercados, aeroportos, rodoviárias e base para sair para grandes caminhadas.

Para facilitar nossa visita, separarmos o parque em três partes:

  • Norte: ao leste a cidade de Lençóis, onde há um aeroporto, a oeste o Capão, onde o asfalto está por chegar
  • Centro: a leste Andaraí e Igatu, a oeste Guiné, a principal base para visitar o Vale do Pati
  • Sul: ao norte Mucugê, a leste Itaeté e ao sul Ibicoara
  • Fora do parque: há uma inifidade de cachoeiras, poços, até pinturas rupestres. Destacaremos aqui dois atrativos em parques naturais municipais: Pai Inácio e Cachoeirão

Note que há muito mais para visitar além do que vamos contar aqui. Este parque é 360 graus: você pode visitar por cima, por baixo, de frente, às vezes até por trás. Dá para cruzar de sul a norte, de leste a oeste, tem cachoeiras, vales, florestas, história e cultura. Não tem um jeito certo, tem o seu. Com as suas vontades, possibilidades e restrições.

Um último adendo às restrições de cada um. Foi o parque onde vimos mais gente se arriscando em beiras de precipícios. Por mais que um guia possa não ter medo de altura, é diferente dar exemplos e se arriscar, muitas vezes para ter likes ou seguidores em redes sociais.

Nos lembra alguns parques nacionais norte-americanos, onde há placas informando quantas pessoas morreram naquele local na temporada anterior, questionando qual o valor de uma selfie. Independente se você optar por fazer as trilhas de forma auto-guiada ou com um guia, lembre-se que o responsável pela sua segurança é você e que locais como este não têm equipes de resgate.

Norte da Chapada Diamantina: Lençóis e Capão

Lençóis é uma das principais portas de entrada para a Chapada Diamantina

Ali há um aeroporto com voos (nem sempre) regulares de Salvador e Belo Horizonte. Esta é uma cidade histórica cheia de pousadas e excelentes restaurantes. É base para conhecer alguns atrativos que descreveremos abaixo:

Ribeirão do Meio, Ribeirão de Cima e Cachoeira do Sossego

O Ribeirão nasce no alto da Chapada e pode ser visitado em vários pontos. O Ribeirão do Meio é o mais fácil e visitado, fica a 30-50 minutos a pé do centro de Lençóis. O destaque está para o escorregador em cima da pedra, no caminho não deixe de parar na barraca do Uisquinha.

O Ribeirão de Cima é igualmente belo, mas bem mais vazio. Fica no caminho da Cachoeira do Sossego, cuja trilha é fácil para quem é praticante, mas pode ser desafiadora àqueles com menos conhecimento em trilhas, requerendo um guia.

Chegando lá, uma bela queda e um belo poço para banho. Recomendamos ir cedo para aproveitar, mas ficar um pouco além do horário em que a maioria vai embora para almoçar (13h), quando fica vazio e silencioso.

Cachoeira Mandassaia

Esta cachoeira fica num desvio dos caminhos de Lençóis ao Capão. Ao se aproximar da cachoeira, você vê lajedos enormes e secos, vai descendo o que parece o leito de um rio sem água. De repente, um paredão enorme forrado de plantas e musgos, por onde corre a água. Lá embaixo, duas belas quedas d’água e poços para banho. Uma cachoeira bem pouco visitada em comparação às demais.

Pantanal Marimbus

E não é que além de tudo o que há nesse parque, ainda há um pantanal? O principal acesso fica pela comunidade do Remanso, uma comunidade quilombola cujo acesso é mais fácil por Lençóis. Há também a opção de ir via Andaraí, mas por outra comunidade.

O passeio de barco leva cerca de 2h-3h até a cachoeira do Roncador, dependendo do ritmo. Nossa recomendação é ir sem pressa e, para isso, procure ser um dos remadores. Os remadores dos barcos tendem a querer chegar logo ao destino.

Uma vez lá, um belo banho em uma das cachoeiras onde o impacto da mineração parece ter sido dos maiores. A volta pode ser feita de barco rio acima ou por uma bela trilha.

“Do outro lado da Chapada Diamantina” fica o Capão, um local charmoso e menos habitado, mas não menos charmoso

Até alguns anos atrás ali havia uma grande plantação de café, hoje o vale está se recuperando e a vegetação nativa voltando a ter espaço. Os principais atrativos desde o Capão são a cachoeira da Fumaça, Águas Claras e Morrão. De lá também é possível começar a trilha para o Vale do Pati, principalmente se você optar por ir via vale do Calixto.

Cachoeira da Fumaça

Um dos ícones da Chapada, esta pode ser a maior cachoeira do Brasil que pode ser vista e na qual pode-se tomar banho. Não há consenso sobre isso, mas são 385 metros de queda.

Não é só esse o encanto da Cachoeira da Fumaça. Ela tem esse nome porque a água dispersa quando cai e muito dela vira uma fumaça, voltando ao rio original como se fosse um ciclo infinito. Isso não acontece o tempo todo e não há uma temporada específica, mas ocorre geralmente após grandes chuvas.

Como se não bastasse, a Cachoeira da Fumaça pode ser visitada por baixo e de frente, em um roteiro de 3 dias de caminhada e acampamento selvagem. Infelizmente, tivemos um braço quebrado na descida e precisamos retornar sem ver tudo. Recomendamos que se você fizer esse circuito, evite a descida da fenda, há outros caminhos. Se for via fenda, tenha equipamento de segurança (corda) e saiba usá-lo, há trechos com muita exposição e riscos.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_de_quedas-d%27%C3%A1gua_do_Brasil

Lá de cima pouco se vê da cachoeira, mas dá para ver as gotas que voltam dela para cima; a vista do vale é de tirar o fôlego

Águas Claras e Morrão

Como o nome diz, é um local onde as águas, diferente do restante da Chapada Diamantina onde têm uma característica avermelhada, são transparentes. Esta é uma caminhada curta e praticamente plana a partir do Capão, mas que também faz parte de uma travessia de Lençóis ao Capão via Pai Inácio.

Um belo lugar para relaxar, entrar na água e admirar a visão do Morrão e do Morro dos Cristais lá de baixo. É possível subir ao Morrão, também como um bate-e-volta do Capão. Grande parte do trajeto pode ser feita de carro, principalmente onde não há sombra.

Centro da Chapada Diamantina: Guiné, Vale do Pati, Andaraí e Igatu

A parte central do parque é mais conhecida pelo Vale do Pati, que pode começar em Guiné e sair em Andaraí, mas também pode ser um circuito com começo e fim no Guiné. Igatu é uma cidade onde está grande parte do patrimônio histórico cultural a ser visitado.

Guiné e Vale do Pati

Guiné é um distrito de Mucugê e provavelmente com o menor desenvolvimento hoteleiro dos quais falaremos aqui. Mas a maior parte das pessoas que vai até o Vale do Pati passa por lá e há um potencial enorme de crescimento.

O Vale do Pati, como falamos, pode ser visitado de diversas formas. A mais econômica é partindo e voltando a Guiné. Ao cruzar para Andaraí os custos aumentam pela necessidade de “resgate”, ou a logística de ir e vir.

O começo da trilha é uma subida via Aleixo ou pelo Beco, que foi nossa opção. Aos poucos você caminha no que é praticamente o leito de um rio, até que chega ao topo e tem a vista do que estava atrás: as gerais do Rio Preto. Uma belíssima caminhada pelo cerrado (este parque, apesar de ser considerado inserido na caatinga, está na transição de três biomas: mata atlântica, cerrado e caatinga).

Ao fundo você enxerga algumas montanhas, mas ainda não dá para entender o que vai acontecer. Quando você chega ao mirante do Pati fica tudo mais claro. Lá ao fundo, e abaixo, há um belíssimo vale, rodeado de morros icônicos, como o Morro Branco, o Morro do Castelo e o Sobradinho.

Para além de onde a vista alcança fica o caminho a Andaraí. Atrás disso tudo, o vale do Calixto, que foi menos povoado e ainda preserva muita mata nativa.

Há cerca de 10 famílias ainda vivendo no vale, hoje totalmente dedicadas ao turismo. A hospedagem geralmente inclui pensão completa (um belo café da manhã às 7h e um super jantar servido às 19h) além das milhões de estrelas que aparecem quando escurece. O clima aqui é bem diverso, em geral amanhece fechado e com garoa, ótimo para caminhar. Ao longo do dia o céu abre e fica azul.

A acolhida das famílias já seria suficiente se não fossem camas com lençóis, cobertores, colchões de verdade. Com isso, a caminhada fica mais leve e fácil.

Durante o dia há diversas trilhas e atrativos para conhecer no Vale, destacamos a subida ao Morro do Castelo, onde fica uma belíssima Lapa e Gruta, o Poço da Árvore, perfeito para banho, e as Cachoeiras dos Funis.

Complementam a visita ao Vale a vista do Cachoeirão por cima, a segunda mais alta cachoeira da Chapada Diamantina, com 270 metros. É uma outra perspectiva que só nos faz pensar que nesta primeira visita ainda faltou muito o que conhecer. E olha que passamos 4 dias / 3 noites por ali.

Igatu

Não é tão fácil chegar a Igatu em dias chuvosos se você não tiver um 4×4. No que já foi um dos principais centros de garimpo de diamantes, hoje há uma vila de pedras. As enormes pedras foram retiradas como rejeito de garimpo por escravos, que construíram as paredes que, pela espessura, segue de pé até hoje.

Além de ser base para algumas cachoeiras e trilhas, Igatu tem uma Galeria de Arte e Memória onde ficava seu centro nos tempos do garimpo. Hoje é um museu a céu aberto que abriga, além de obras de arte, a história escrita e em objetos usados tanto na época do garimpo quanto no momento da extração de madeira e flores sempre-vivas.

Sul da Chapada Diamantina: Mucugê, Itaeté e Ibicoara

Mucugê fica bem onde há uma estrada que corta o parque. Ao cruzá-la a paisagem muda, as belas formações rochosas ficam de um lado e as grandes plantações, principalmente de batatas, ficam do outro. Dali para o sul a área do parque é menos visitada e nos deu a sensação ser ser mais prístina.

Cachoeiras das Andorinhas e Funis

Uma caminhada curta em Y ou mesmo cortando em triângulo permite passar um belo dia entre a cachoeira das Andorinhas e dos Funis, passando ou não pelas Sete Quedas, conforme o clima e o volume do rio permitirem.

Apesar de ser tudo belo, foi a cachoeira dos Funis que roubou a atenção, onde há poços de todas as profundidades, sol e sombra o dia todo, uma queda d’água com hidromassagem.

Cachoeira da Sibéria e Mar de Espanha

Esta foi a única trilha que fizemos em que não encontramos ninguém. Uma trilha fácil onde você vai de frente para o que se vê aos fundos da caminhada ao Cachoeirão e chega-se a uma cachoeira onde o impacto da mineração é bem claro.

Não foi o local mais belo, mas foi onde acreditamos que havia mais chances de encontrar fauna, pois fomos seguindo os rastros de uma onça. Este parque, apesar de belo e importante, é um dos que vimos menos fauna, na maior parte das trilhas sequer ouvimos aves cantando, o que é frequente em outros lugares.

Fumacinha por cima

Por Ibicoara há duas cachoeiras a serem visitadas, fazendo o caminho “por baixo”, ou seja por dentro do cânion: Fumacinha e Véu de Noiva. Quis o destino que não pudéssemos visitá-las na época em que fomos, mas fomos então conhecer a trilha da Fumacinha por cima.

Uma trilha despretenciosa, que ode ser feita tanto por quem está em Mucugê quanto em Ibicoara num dia só. Uma trilha relativamente fácil, sem pontos de dúvida para onde seguir, com uma subida leve, um trecho plano e uma descida curta.

O caminho revela um dos locais que parece ter recebido menos interferência humana na região, os belos campos rupestres e o cerrado são bem protegidos. Ao final da trilha, a vista para o cânion do rio Una. Se de cima é um espetáculo, de baixo dever ser ainda mais (são 18km de trilha ida e volta, evite fazer se tiver chovido na noite anterior tanto pelo risco de escorregar quanto de cabeça d’água).

Além da Chapada Diamantina: Pai Inácio e Buracão

Ao norte do parque fica o Parque Natural Municipal do Morro do Pai Inácio, no município de Palmeiras. Um dos ícones da região da Chapada Diamantina fica fora do parque nacional, mas é de lá que há uma das mais belas vistas da região, com fácil acesso. Recomendamos ir na hora do por do sol. E se for dia de Lua Cheia, olhe para o lado oposto ao por do sol e surpreenda-se.

A cachoeira do Buracão é muito famosa na região, mas pouco se fala sobre o Parque Natural Municipal do Espalhado, onde ela fica. Um parque que vai ao longo do rio Una em uma região onde, independente das chuvas, o rio pode ser atravessado a pé pelos tropeiros e seus animais. Cheio de cachoeiras e pontos de mirantes, vale a pena visitar sem pressa.

A cachoeira do Buracão é um espetáculo. A entrada é a nado, com colete salva-vidas, por meio de um cânion forrado de musgos de todos os tons de verde, amarelo e vermelho. Até que chega-se ao salão principal, onde está uma queda enorme, imponente, mas que não gera tantas ondas. Há quem desça de rapel, mas é possível ir na parte de cima (aqui também é 360 graus) para admirar e fotografar.

E a água avermelhada?

Se há uma marca da Chapada Diamantina, são suas águas avermelhadas. E serão elas naturais ou também fruto de ação humana?

Pois bem, suas águas avermelhadas não são fruto das mudanças provocadas pelo homem. A “água escura”, como muitos dizem, nasce assim.

A cor é resultado de matéria orgânica, inclusive tanino, um elemento antioxidante. Se você não souber onde captar água corretamente, não se arrisque, peça a um guia. Se souber, aproveite de caminhar com pouco peso e pegar água no caminho.

No link você pode acessar o mapa por onde passamos e ver em detalhes onde fica cada localidade citada acima:

2 comentários em “Parque Nacional da Chapada Diamantina: o parque 360 graus

  1. Dani Matielo says:

    Oi, queridos,

    Passei por aqui porque estava precisando ver fotos de natureza e sol para relaxar a mente e me inspirar no meio do frio. Adorei ler os posts – obrigada por compartilhar essa experiência com a gente. Um beijo grande!

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