Pertinho de Aracaju fica um belíssimo, de fácil acesso e variado parque nacional. Em termos de tamanho, é um dos menores. Mas quem disse que tamanho é documento?

Em seus 8 mil hectares já nascentes, cachoeiras, florestas, campos, lindas vistas

Esta região é há muito tempo utilizada pela população do entorno. Seja para aproveitar as cachoeiras ou a água que ali nasce e corre até as cidades vizinhas e Aracaju, seja para rituais religiosos.

Inicialmente pensou-se criar aqui uma Estação Ecológica, que é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral, assim como um Parque Nacional, mas que não permite uso público, logo o turismo de natureza não seria permitido.

Com diversas conversas com a comunidade, que visita com frequência para banhar-se e realizar ali romarias para o cume da serra e oferendas ao longo dos cursos dos rios, decidiu-se por um Parque Nacional.

Foi necessário as atividades religiosas a fim de permitir que o parque cumpra seu papel

Hoje o fogo que era ateado nos campos após as romarias não ocorre. Hoje as oferendas são retiradas por um integrante do grupo que as fez, passado o tempo previsto para que a demonstração da fé seja realizada sem prejuízos ao meio ambiente.

É muito bom chegar a um parque que é usado pela população do entorno. Os parques nacionais são para todos, mas quanto mais envolvidos e beneficiados forem aqueles que moram ali perto, melhor para todos: mais bem conservado o parque, mais azeitada a gestão, mais benefícios para a população.

Neste parque há uma única questão que extrapola: o lixo. Há muito lixo, desde papel de bala até latinhas de cerveja e garrafas pet ao longo do rio. Poucos parques têm lixeiras e não vimos nenhum com tantas lixeiras quanto aqui. Mesmo assim, podem ser melhor utilizadas.

Não temos uma conclusão única, pois cada local tem suas particularidades, mas será que ao retirar as lixeiras não seria criada uma maior consciência de que o lixo deve ser retirado por aquele que o levou?

Será que ao invés de instalar lixeiras não deveria haver um incentivo maior à educação? Mas quem é responsável por isso? Difícil deixar a cargo do ICMBio algo que deve permear nossa educação desde pequenos.

Voltando à parte boa da comunidade. Neste parque encontramos um grupo de biólogos, alguns inclusive professores atuantes, que se reuniram para não somente conduzir visitantes, mas também alunos.

Com isso, circulam com frequência no parque, analisam, discutem, propõem, cobram. O entusiasmo desse grupo é sem dúvida a maior segurança que qualquer um de nós pode querer: a sociedade civil está ativamente empenhada em proteger nosso patrimônio junto dos órgãos competentes, cada um com sua visão e atuação: https://www.instagram.com/serradeitabaiana

Apesar de ter nome de uma Serra, a de Itabaiana, este parque é composto por três Serras: Itabaiana, a mais alta, Comprida, a mais longa, e do Cajueiro, a mais afastada.

Itabaiana é uma palavra de origem tupi, mas cujo significado é incerto

E provavelmente continuará sendo, pois quem deu o nome já não está mais lá. O nome pode tanto significar “espia” por ser da serra de onde os indígenas espiavam o que acontecia nas planícies que levam até o mar.

Mas, combinando os fonemas, pode significar “serra morada dos homens de onde vêm a água”. Interessante que cada nome diz respeito a um ponto de vista. Espia pode ser de quem ali morava, a “morada dos homens…” pode dizer respeito a quem vivia fora dela.

O que marca neste parque, além das nascentes e das serras com amplas vistas é a água de cor avermelhada que corre sobre uma pedra branca. O efeito que isso causa tanto de fora, olhando para os poços, quanto de dentro, quando você está na água, é incrível.

A matéria orgânica que desce junto da água denuncia que trata-se de uma água bem rica. Não é à toa que grande parte dessa água seja usada hoje na lavoura de cana de açúcar.

Na Serra de Itabaiana há uma portaria e uma sede do ICMBio. Na sede há dois paus-brasil que estavam floridos quando estivemos lá. Um privilégio poder ver a árvore símbolo do nosso país de pé e florida, nunca havíamos visto sua flor.

Dali segue-se por uma trilha bem demarcada até o Poço das Moças, o ponto mais visitado do parque. Pudera, até porque o fácil acesso, a água limpa e refrescante, combinados com a diversidade de locais para banho (dos mais fundos aos mais rasos) chama a atenção e a visitação de crianças e adultos. Durante nossa visita, passamos por ali três vezes, e sempre havia alguém aproveitando.

Do Poço das Moças há dois caminhos: um margeia o rio dos Negros até a nascente e outro sobe a Serra

Pelo rio dos Negros chega-se a uma laje de pedra por onde corre uma fina camada de água, o suficiente para mantê-la escorregadia, mas não tanto a ponto de torná-la perigosa. O Salão dos Negros é um dos lugares mais bonitos e significativos onde já estivemos.

Ali a água que nasce logo acima, entre pedras, desce gotejando pelas raízes e folhas, formando um jardim. A diversidade de sons, cheiros e plantas entrega que aqui estamos na Mata Atlântica. Some-se a isso o fato de que nesse local muitos negros esconderam-se após fugir de engenhos onde eram mantidos escravizados.

A energia do local é impressionante e faz com que a beleza não seja o único atrativo, o que já seria suficiente.

Pelo outro caminho sobe-se a Serra de Itabaiana até o topo, passando ao lado da mata que abraça o Salão dos Negros.

Onde antes víamos um belo vale, hoje vemos uma nascente de água

Lá de cima a vista impressiona, podendo chegar até Aracaju e o mar em dias claros. Ainda há pessoas vivendo ali e criando gado. Também há uma série de antenas, por isso o topo em si não é tão convidativo. Por isso, indo para o outro lado, que dá vista para a cidade de Itabaiana nos deparamos com uma bela vista do paredão que é formado e forrado de plantas ali.

Seguindo mais um pouco há dois caminhos, um que vai para o Caldeirão e outro para o Poço Negro. Optamos pelo segundo, onde chegamos a uma bela cachoeira com água avermelhada, mas correndo sobre pedras pretas. Com isso, o efeito de entrar na água é como entrar em um buraco sem luz.

Lá da Serra também é possível avistar o Parque dos Falcões. Esse parque não faz parte do Parque Nacional, mas é interessante visitá-lo. Ali algumas aves que são resgatadas de contrabando ou encontradas debilitadas são levadas para se recuperarem e procriarem. Algumas dessas voltam ao ambiente natural, quando reabilitadas e desde que haja habitat para as mesmas.

O gavião caranguejeiro, por exemplo, não tem mais habitat. Por mais sucesso que possa haver na reabilitação e cruzamento da espécie, ele não sobreviverá no que era seu ambiente original. Triste pensar, nos faz então questionar a necessidade desse tipo de parque. Mas, logo lembramos que cada um deve fazer sua parte, não podemos esperar de um grupo de biólogos ou conservadores de aves de rapina que seja responsável por garantir habitat para as aves.

Visitar um local como o Parque dos Falcões nos permite aprender muito sobre as aves, mas também refletir no papel que cada um de nós precisa ter para que esse todo chamado natureza, possa ser reconstruído de forma que o respeito com os animais humanos e não humanos, seja atendido.

No pé da Serra de Itabaiana fica a Cachoeira dos Encantados. Para chegar lá o caminho não é pela portaria ou pela sede, mas diretamente pelo paredão. Uma caminhada mais dura para quem não está tão acostumado, mas bem densa e bela. Ali aparecem diversas espécies de sapos e cantos de aves. Ali chegamos até uma cachoeira cuja água escorre pela longa raiz das plantas acima em frente a uma pequena caverna.

Um local maravilhoso e delicioso. Tivemos o privilégio de ser conduzidos pelo grupo de biólogos que falamos anteriormente, o que nos enriqueceu em conhecimento e em esperança. Sabemos que com eles envolvidos, este parque continuará sendo muito bem protegido.

A Serra Comprida, apesar de ser a mais longa, tem apenas um ponto de visitação ao qual conseguimos chegar, o topo. Ainda que haja ali antenas, a subida não é fácil, a estrada está em péssimas condições. A vista é ampla, mas honestamente a subida não parece valer tanto a pena.

Vale sim à pena ir até a ponta sul do parque na Serra do Cajueiro, onde ficam os Pilões do Ribeira

Mesmo com indicações não foi fácil achar, pois não muito distante ficam os Poções do Ribeira e muita gente confunde o nome.

Um local aconchegante, um rio de águas vermelhas por cima de pedras brancas e bastante sombra das árvores. Um local que, por ser menos visitado que o Poço das Moças, está mais bem protegido. A dica é levar um livro e passar o dia por lá.

Gostaríamos de ter nos hospedado na cidade de Itabaiana, de onde teríamos mais fácil acesso ao parque, além de conviver com o pessoal do entorno. Mas, morando em um trailer, nem sempre conseguimos um local com infraestrutura próxima para ficar. Acabamos ficando em Aracaju, o que nos faz pensar duas coisas:

Se você for para Aracaju, não deixe de ir até o parque pelo menos um dia! É perto e vale a pena pelo menos conhecer e tomar banho de rio;

Se você for visitar o parque, procure ficar em Itabaiana mesmo, ali há pousadas, restaurantes; não há local próprio para trailers, mas há uma boa infraestrutura.

No link você pode acessar o mapa por onde passamos e ver em detalhes onde fica cada localidade citada acima:

2 comentários em “Parque Nacional da Serra de Itabaiana: o parque das águas avermelhadas

  1. Marcelo Dias Pulido says:

    Há seis anos fizemos uma aventura parecida com a vossa. De São Paulo, rodamos o Brasil em busca de um lar e, nove meses e onze estados depois, achamos em Itabaiana nossa casa! Hoje, moramos ao pé da Serra que vocês tão belamente descreveram, dentro do próprio Parque. Obrigado e sucesso na empreitada, continuem o lindo trabalho de divulgação!

    • dennishyde says:

      Ahá! Vocês já encontraram a casa então? E que lugar maravilhoso que escolheram, hein? Nós ainda vamos rodar mais uns anos e ver todos eles antes de decidir, kkk. Abraços

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